terça-feira, 6 de maio de 2008

Imagens Acidentais

Desperta a noite;
o orvalho enche a manhã.
Um cheiro a saudade.

Hera pelo muro
rastejando palmo a palmo —
o verde e o viço.

Ao abrir do sol,
se espreguiça o amarelo
pelas maravilhas.

A água dormente:
no lago chapinha a lua,
embalando peixes.

Do reino do sol,
a grande flor amarela,
trouxe a escravidão.

Vem a solidão
comigo pelo caminho.
Já seremos dois.

Esta mesma nuvem,
que voa branca no céu
poisa negra em terra.

Luz pela janela
onde a noite se consome
a brilhar o tempo.

O outono vem
nas aves que, ao partirem,
trouxeram o frio.

Um ninho vazio
de cegonhas que chocaram
sua própria ausência.

Não se vê o rio
que só pelos sonhos corre
debaixo do leito.

As sombras se alongam
pelo caminho da tarde:
vou à minha frente.

Olham as estrelas
plo rosto negro da noite.
Nunca estamos sós.

A manhã que acorda
espreguiça a luz recente
na terra que dorme.

O gato e o sol
sentados no peitoril —
ronronam a par.

Na noite profunda
bate o silêncio estrelado.
Quantas badaladas?

O poente e a papoila
pintaram-se de vermelho:
o sangue e o riso.

As sombras da tarde
já desenham sobre o chão
a outra cidade.

Na noite do campo,
os pirilampos acendem
os negros caminhos.

Chove sem parar.
O inverno trouxe o frio
ao calor da casa.

O verão lateja
nas casas brancas ao sol:
coração de agosto.

Na manhã tranquila,
a vela branca no mar
pontilha o azul.

No fim do verão,
luz e folhas amarelas
a cair do sol.

Imersa no verde,
o desejo me faz folha,
ao sabor a brisa.


de Luísa Freire

Sem comentários: