quinta-feira, 27 de março de 2008
Meu amor meu amor
Meu amor meu amor
meu corpo em movimento
minha voz à procura
do seu próprio lamento.
Meu limão de amargura meu punhal a escrever
nós parámos o tempo não sabemos morrer
e nascemos nascemos
do nosso entristecer.
Meu amor meu amor
meu nó e sofrimento
minha mó de ternura
minha nau de tormento
este mar não tem cura este céu não tem ar
nós parámos o vento não sabemos nadar
e morremos morremos
devagar devagar.
de Ary dos Santos, in As palavras das Cantigas
meu corpo em movimento
minha voz à procura
do seu próprio lamento.
Meu limão de amargura meu punhal a escrever
nós parámos o tempo não sabemos morrer
e nascemos nascemos
do nosso entristecer.
Meu amor meu amor
meu nó e sofrimento
minha mó de ternura
minha nau de tormento
este mar não tem cura este céu não tem ar
nós parámos o vento não sabemos nadar
e morremos morremos
devagar devagar.
de Ary dos Santos, in As palavras das Cantigas
quarta-feira, 26 de março de 2008
Shiki ... e a Primavera tarda ...
Na praia arenosa,
pegadas. É primavera —
longo vai o dia.
Passada a tormenta,
sol tardio brilha na árvore
onde a cigarra canta.
Nuvens ondeantes —
amontoadas ao sul,
barcos, brancas velas.
Perto das ruínas,
as aves a vaguear
por entre o hibisco.
Na curva da estrada,
já pode avistar-se o templo —
rústicos crisântemos.
Aqui e ali
um veado transparece
no meio dos arbustos.
Não há jardineiro —
o jardim em liberdade
e por aparar.
O sol da tardinha
trespassa a vegetação,
pousando na rede.
Na ilha do lago,
lá onde ninguém habita,
é densa a folhagem.
de Matsuo Bashô
pegadas. É primavera —
longo vai o dia.
Passada a tormenta,
sol tardio brilha na árvore
onde a cigarra canta.
Nuvens ondeantes —
amontoadas ao sul,
barcos, brancas velas.
Perto das ruínas,
as aves a vaguear
por entre o hibisco.
Na curva da estrada,
já pode avistar-se o templo —
rústicos crisântemos.
Aqui e ali
um veado transparece
no meio dos arbustos.
Não há jardineiro —
o jardim em liberdade
e por aparar.
O sol da tardinha
trespassa a vegetação,
pousando na rede.
Na ilha do lago,
lá onde ninguém habita,
é densa a folhagem.
de Matsuo Bashô
terça-feira, 25 de março de 2008
Redacção
Uma senhora pediu-me
um poema de amor.
Não de amor por ela,
mas «de amor, de amor».
À parte aquelas trivialidades
«minha rosa, lua do meu céu interior»
que podia eu dizer
para ela, a não destinatária,
que não fosse por ela?
Sem objecto, o poema
é uma redacção
dos 100 Modelos
de Cartas de Amor.
de Alexandre O'Neil
um poema de amor.
Não de amor por ela,
mas «de amor, de amor».
À parte aquelas trivialidades
«minha rosa, lua do meu céu interior»
que podia eu dizer
para ela, a não destinatária,
que não fosse por ela?
Sem objecto, o poema
é uma redacção
dos 100 Modelos
de Cartas de Amor.
de Alexandre O'Neil
segunda-feira, 17 de março de 2008
Amigo
Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!
de Alexandre O'Neil
Inaugurámos a palavra «amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!
de Alexandre O'Neil
quinta-feira, 13 de março de 2008
Um beijo
Foste o beijo melhor da minha vida,
ou talvez o pior...Glória e tormento,
contigo à luz subi do firmamento,
contigo fui pela infernal descida!
Morreste, e o meu desejo não te olvida:
queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
e do teu gosto amargo me alimento,
e rolo-te na boca malferida.
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
batismo e extrema-unção,
aquele instante por que, feliz, eu não morri contigo?
Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto,
beijo divino! e anseio delirante,
na perpétua saudade de um minuto....
de Olavo Bilac
ou talvez o pior...Glória e tormento,
contigo à luz subi do firmamento,
contigo fui pela infernal descida!
Morreste, e o meu desejo não te olvida:
queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
e do teu gosto amargo me alimento,
e rolo-te na boca malferida.
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
batismo e extrema-unção,
aquele instante por que, feliz, eu não morri contigo?
Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto,
beijo divino! e anseio delirante,
na perpétua saudade de um minuto....
de Olavo Bilac
Súplica
Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim, Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada
de Miguel Torga
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim, Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada
de Miguel Torga
segunda-feira, 10 de março de 2008
From The UK
For mirth doth search the bottom of annoy;
Sad souls are slain in merry company;
Grief best is pleas’d with grief’s society.
True sorrow then in feelingly suffic’d
When with like semblance it is sympathiz’d.
‘Dear lord, thy sorrow to my sorrow lendeth
Another power; no flood by raining slaketh.
My woe too sensible thy passion maketh,
More feeling-painful. Let it then suffice
To drown one woe, one pair of weeping eyes.’
de Shakespeare
Sad souls are slain in merry company;
Grief best is pleas’d with grief’s society.
True sorrow then in feelingly suffic’d
When with like semblance it is sympathiz’d.
‘Dear lord, thy sorrow to my sorrow lendeth
Another power; no flood by raining slaketh.
My woe too sensible thy passion maketh,
More feeling-painful. Let it then suffice
To drown one woe, one pair of weeping eyes.’
de Shakespeare
O Caminho estreito
Também esta cabana de colmo
se há-de transformar
em casa de bonecas
Que glória
as folhas verdes as folhas novas
sob a luz do sol
Nem o picanço
tocará esta ermida
suspensa entre as árvores de verão
Ficou plantado o arrozal
quando me despedi
do salgueiro
O berço da poesia
os cantos dos plantadores de arroz
no longínquo norte
Mãos que hoje plantam arroz
outrora ágeis desenhos
imprimiam como uma pedra
Das cerejeiras em flor
ao pinheiro de dois troncos:
três meses
Criadoras de bichos da seda
as suas roupas
aroma de antiga inocência
Na frescura
me estendo
como no meu leito
Quietude:
as cigarras escutam
o canto das rochas
O cálido dia:
o rio Mogami
deita-o ao mar
Cabanas dos pescadores:
apanhando a frescura do entardecer
estendidos sobre as portas
O ninhos de «misagos»
sobre uma rocha no mar:
jurariam as ondas não lhes tocar
O Sétimo Mês
a noite do sexto dia
não me parece a de sempre
Penetro no aroma do arrozal
à minha direita
a cólera do mar
O sol arde
sem compaixão
Mas o vento é de Outono
Que nome delicado
O vento entre os pinheiros
os trevos os juncos
Se hei-de morrer no caminho
que seja
entre os campos de trevo
Hoje o orvalho
apagará o teu nome
do meu chapéu
Toda a noite
escutei
o vento de Outono na montanha
de Matsuo Bashô
se há-de transformar
em casa de bonecas
Que glória
as folhas verdes as folhas novas
sob a luz do sol
Nem o picanço
tocará esta ermida
suspensa entre as árvores de verão
Ficou plantado o arrozal
quando me despedi
do salgueiro
O berço da poesia
os cantos dos plantadores de arroz
no longínquo norte
Mãos que hoje plantam arroz
outrora ágeis desenhos
imprimiam como uma pedra
Das cerejeiras em flor
ao pinheiro de dois troncos:
três meses
Criadoras de bichos da seda
as suas roupas
aroma de antiga inocência
Na frescura
me estendo
como no meu leito
Quietude:
as cigarras escutam
o canto das rochas
O cálido dia:
o rio Mogami
deita-o ao mar
Cabanas dos pescadores:
apanhando a frescura do entardecer
estendidos sobre as portas
O ninhos de «misagos»
sobre uma rocha no mar:
jurariam as ondas não lhes tocar
O Sétimo Mês
a noite do sexto dia
não me parece a de sempre
Penetro no aroma do arrozal
à minha direita
a cólera do mar
O sol arde
sem compaixão
Mas o vento é de Outono
Que nome delicado
O vento entre os pinheiros
os trevos os juncos
Se hei-de morrer no caminho
que seja
entre os campos de trevo
Hoje o orvalho
apagará o teu nome
do meu chapéu
Toda a noite
escutei
o vento de Outono na montanha
de Matsuo Bashô
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