terça-feira, 15 de janeiro de 2008

De Miguel Torga

Sonho, mas não parece.
Nem quero que pareça.
É por dentro que eu gosto que aconteça
A minha vida.
Íntima, funda, como um sentimento
De que se tem pudor.
Vulcão de exterior
Tão apagado,
Que um pastor
Possa sobre ele apascentar o gado.
Mas os versos, depois,
Frutos do sonho e dessa mesma vida,
É quase à queima roupa que os atiro
Contra a serenidade de quem passa.
Então, já não sou eu que testemunho
A graçaDa poesia:É ela, prisioneira,
Que, vendo a porta da prisão aberta,
Como chispa que salta da fogueira
Numa agressiva fúria se liberta.


in Orfeu Rebelde

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